Sobre o Curso
Você já parou para pensar em quantos autores negres você já leu? Em como o conhecimento que absorvemos é majoritariamente europeu, norte-americano e branco? Você sabia que diferentes saberes e tipos de conhecimento foram suprimidos em detrimento da visão de mundo colonizadora?
Com o decorrer do colonialismo, saberes africanos, e posteriormente indígenas, passaram por esse processo. Por consequência, saberes que determinavam outras concepções de gênero, de raça, de estruturação social, que não compactuavam com a visão dos colonialistas também foram afetados, fazendo com que, muitas vezes, nem os conheçamos e nem saibamos que outros tipos de estruturações sociais seriam possíveis.
Por sua vez, a luta decolonial sempre fez resistência, e hoje mais do que nunca, devemos falar sobre epistemicídio e mudar essa conjuntura!
** Este foi realizado no formato on-line/ao vivo. Após edição, estamos disponibilizando de forma gravada.
Objeto geral
Este curso irá fornecer uma introdução aos principais conceitos e abordagens dos estudos de raça e gênero no Brasil, indicando alguns atravessamentos fundamentais dentro desses saberes, bem como sua relação com a produção intelectual de Sueli Carneiro, Lélia Gonzáles, Beatriz Nascimento e outras/os intelectuais que se destacam nos estudos de gênero e sexualidade no Brasil, tais como James Green, João Silvério Trevisan, Heloisa Buarque de Holanda, Jaqueline Gomes de Jesus, Viviane Vergueiro e Tatiana Nascimento.
Objetivos específicos
1- Identificar e discutir alguns conceitos e temas abordados pelos estudos de relações raciais no Brasil e como esses se relacionam com a produção de conhecimento.
2- Abordar alguns aspectos históricos e principais categorias do debate de gênero na atualidade a fim de elucidar o desenvolvimento desse campo de estudos no Brasil.
3- Discutir sobre o pensamento e produção intelectual dos estudos de relações raciais no Brasil através das obras de Sueli Carneiro e Lélia Gonzáles.
4- Como às intersecções de gênero e raça aparecem nas obras de Beatriz Nascimento e Viviane Vergueiro, e como suas produções tensionam novas fronteiras interpretativas no contexto brasileiro.
5- Através da trajetória das autoras e sua produção intelectual temos como objetivo debater temas como produção de conhecimento, racismo, sexismo, colonialismo e novas epistemologias.
Programação do curso
Aula 1 – “Falarei do lugar da escrava”: Introdução ao pensamento decolonial de Sueli Carneiro.
A primeira do curso tem como objetivo analisar, a partir dos estudos de Sueli Carneiro, a crítica a construção histórica da produção de conhecimento sobre as mulheres negras no Brasil. Os escritos de Sueli Carneiro nos apresentam as “novas” máscaras de silenciamento no discurso das sociedades contemporâneas e quais práticas simbólicas reiteram essas posições em nossas relações sociais. Demonstrando a existência de um contrato racial que se constitui em um acordo de exclusão e subalternização da população negra no Brasil, refletiremos acerca do epistemicídio como uma ferramenta estratégica para produção de desigualdades.
Aula 2 – “Agora o lixo vai falar, e numa boa”: Introdução à Lélia Gonzalez e os estudos sobre a mulher negra no Brasil.
A segunda aula do curso está direcionado a crítica sobre a construção dos papéis de gênero e raça no Brasil a partir da experiência histórica de mulheres negras. Neste encontro nos propomos a compreender a construção e aprofundamento da reflexão sobre o papel da mulher negra na sociedade brasileira através dos pensamentos de Lélia González e Beatriz Nascimento.
Aula 3 – A ditadura hétero-militar e a formação do campo de estudos de gênero no Brasil.
Nesta aula realizamos uma breve introdução sobre a construção dos estudos de gênero no Brasil, contextualizando a categoria e a conectando com o contexto político e social. Após esse sucinto panorama, procuramos compreender como as normatizações de gênero e raça são forjadas por meio de uma estrutura de saber e poder colonial que expõem determinados corpos e experiências a condições diferenciadas de precariedade.
Aula 4 – : Desertando o gênero como prática de descolonização.
Ampliando a abordagem de gênero para além dos problemas relacionados “a mulher”, nesse encontro procuraremos introduzir categorias determinantes para o debate contemporâneo de gênero: cistema, ciscolonialidade, cisgeneridade, bem como os processos que estão implicados nessas terminologias, como por exemplo, a ideia de coerência entre: sexo – desejo – orientação sexual – identidade de gênero. Tomando como referência as reflexões de Tatiana Nascimento, Jaqueline Gomes de Jesus e Viviane Vergueiro, procuraremos tensionar essa ideia de modo a compreender como o gênero se configura como ferramenta colonial e como ele pode ser articulado como possibilidade de transgressão da colonialidade do ser.
Público-alvo
Estudantes de graduação e pós graduação, pesquisadores/as, professores/as da rede pública, educadores/as sociais, integrantes de coletivos culturais, militantes de movimentos sociais e interessados/as na temática.
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